sábado, 28 de maio de 2016

o terceiro de quatro

sou criado no seio de uma família unida, grande e que tenta sempre ser harmoniosa. somos quietos, baixos, miúdos por natureza, engolimos sapos, nos negligenciamos pelo bem de do outro, agindo, mesmo que veladamente, em prol da primeira instituição feita pelo homem.

Eis que nos encontramos com peça chave nesse texto. O homem. A família. E o homem no ambiente familiar.

Tive em minha vida a experiência dos pais casados, que moram na mesma casa, que pouco se beijam ou se abraçam, mas que sempre procuram cuidar de seus rebentos da melhor maneira possível, claro, cada um de um jeito. A mãe, sempre peça mestre no amor e sentimentalismo e o pai, sempre peça fundamental no desenvolvimento crítico, analítico e racional, mesmo não sendo o maior exemplo de maestria nestes campos. Gosto de pensar que são dois lados diferentes de uma moeda, visto que o casamento ainda os une, mas são completamente diferentes em suas ações. É claro como a água mais cristalina da face da terra que temos dois lados diferentes, duas peças que se repelem unidas pelo Estado e pela religião, como milhões de pessoas nesse país e bilhões no mundo.

Há alguns anos eu cresci só em minha própria casa. Este era meu templo, este era meu recanto, refúgio e morada. Esta ainda é uma parte fundamental de mim. Estas paredes, as camas, os quartos, as mesas, contanto que agora, já não choro tanto, não sonho e nem fodo tanto. Nada acontece mais, desde, claro, aconteceu minha morte, que completará três anos nos próximos meses. Me formei em minha casa. Estudei, trabalhei, amei em minha casa. Repito, ela é uma parte fundamental de mim.

Eu ainda tento, com todas as minhas forças, sair daqui, trabalhar muito, tentar dar uma guinada em minha vida e agir independentemente, mudar completamente, largar essa casca grossa que me criei, que aconteceram as coisas. Nos últimos meses parei de questionar as coisas em voz alta e simplesmente as aceitei e tentei entender as razões delas serem do jeito que são. Por isso o gancho sobre o seio familiar, sobre minha criação aqui, nessa casa, lugar que sempre escrevo aqui.

Faz parte da minha criação e de minha formação ficar parado no mesmo lugar, quieto, com olhos baixos e pensar, questionar, argumentar, agir com tudo em minha cabeça, comigo mesmo. Observar o mundo, ver como é e tentar entendê-lo como é.

Olha. Leitor. Sinceramente, peço desculpas por todo este rodeio. Eu não me aguentei de medo do futuro. Não me aguentei de terror, tremor nas pernas e me acabo de chorar depois de meses intacto nesse sentido. Não consigo mais organizar minhas ideias e pensar direito, eu tô tentando, eu juro que tô. É. Leitor. Achei algumas fotos tiradas por meu pai em seu celular, a filha de um antigo -suposto- caso dele. Não. Não é só isso. Nunca é. Tem um garoto junto a garota na foto. O caso é branco. O garoto é da minha cor. E ele se parece pra caralho com meu pai.

Não sou mais o último filho de meu pai.

Não sou mais portador da sinceridade e harmonia desta casa. Agora sou um guardião de um segredo que pode destruir essa casa. Eu não sei o que com isso. Não sei se espalho pra alguém. Meu Deus. O que eu fui fazer. Deus, por favor, me perdoe. Meus erros já eram suficientemente imperdoáveis para arcar com minha própria paz interior, agora essa.

Não quero explicações. Quero sumir. Gritar. Porra. Qualquer coisa.

UPDATE: Achei um vídeo. Em que meu pai agradece a todas as coisas e fala justamente do assunto do início deste post, coincidentemente, harmonia, amor, respeito a tudo e a todos ao nosso redor. Ele, num monólogo de três minutos, agradecendo, estando feliz e pedindo para quem assistisse, para respeitar a todos, olhar ao redor, pensarmos melhor no que estamos fazendo e o que podemos fazer para melhorar o mundo. Esse vídeo foi feito logo após ele me deixar na casa de praia de um colega da faculdade, onde eu bebi e tive inúmeras estórias para contar por semanas. Eu ainda choro desde que vi esse vídeo, há meia hora. Acontece que, o vídeo foi feito às 8 horas da manhã. As fotos dessas duas crianças foram tiradas às 15 horas da tarde. Num parque, num SESC na verdade, com todos sorrindo, em um parquinho, mas nenhum adulto ali. Eles estavam atrás da camera. Que porra. Que porra. Que porra...